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Jolie concede entrevista para o The Guardian – Pt. 2

5 de setembro de 2021

Neste sábado, dia 04 de Setembro de 2021, o jornal britânico “The Guardian” publicou em seu website oficial uma extensa entrevista exclusiva com nossa musa inspiradora, Angelina Jolie. Confira a segunda parte da matéria traduzida na íntegra pelo Angelina Jolie Brasil e veja as scans em nossa Galeria!

Fotos por Mary Rozzi
Styling por Jason Bolden
Cabelo por Renato Campora
Maquiagem por Francesca Tolot
Escrito por Simon Hattenstone

Aos sete anos, Jolie fez sua estreia no cinema no filme “Lookin ‘To Get Out”, dirigido por Hal Ashby, interpretando a filha do personagem de Voight. Aos 16 anos, ela foi modelo de trajes de banho e, aos 20, estrelava “Hackers – Piratas de Computador” ao lado de seu futuro marido, Jonny Lee Miller. Em 2000, aos 24 anos, ela ganhou o Oscar de melhor atriz coadjuvante pela interpretação visceral de uma paciente psiquiátrica no filme “Garota, Interrompida”.

Em 2013, Jolie ganhou cerca de US$33 milhões, principalmente através de seu contrato com a marca Louis Vuitton e, posteriormente, interpretando o papel de Malévola, no filme de mesmo nome lançado em 2014. Sua escolha de papéis sugere que ela atua, primeiramente, pelo dinheiro, mas Jolie também participa de filmes de qualidade ímpar (ela foi ótima interpretando o papel de Mariane Pearl, esposa do repórter Daniel Pearl, no filme “O Preço da Coragem”, apesar da polêmica gerada pelo fato de uma mulher branca ter interpretado uma mulher mestiça).

Antes de se separar de Pitt, ela estava se estabelecendo como cineasta. “First They Killed My Father”, o último filme que ela fez como diretora (lançado em 2017), é um retrato assombroso das vidas das pessoas sob o comando do Khmer Vermelho, no Camboja, no qual ela induziu performances excepcionais e discretas de seus atores – especialmente as crianças. Desde então, sua carreira ficou em segundo plano, pois ela se dedicou a ser mãe em tempo integral.

Ela sente que seus direitos sempre foram respeitados? “Hmm. Está é uma boa pergunta para terapia.” Ela faz uma pausa. “Acho que minha mãe fez muito para garantir meus direitos e me capacitar. Mas você sabe, comecei a trabalhar muito jovem para ajudá-la a pagar as contas e outras coisas. Não sabia como eu merecia ser tratada como jovem e como ser humano. Não sentia que havia nascido com esses direitos e proteções. Sempre achei que essas eram coisas pelas quais você tinha que exigir ou lutar e que, às vezes, seria vista como uma pessoa difícil caso as cobrasse.” Você é vista como difícil? “Eu certamente desafiarei quem estiver no meu caminho para fazer tudo o que eu acho que precisa ser feito.”

Quando foi a primeira vez que você se sentiu suficientemente desrespeitada na indústria cinematográfica a ponto de mandar alguém se foder? “Erm… bem, não é nenhuma surpresa, com Harvey Weinstein. Trabalhei com ele quando era jovem.” Ela tinha 21 anos quando trabalhou no filme da Miramax, “Corações Apaixonados”, produção executiva do infame predador sexual e estuprador condenado. Ela diz que as mulheres, muitas vezes, minimizam um abuso quando conseguem escapar dele – como ela fez na época. “Se você sair da sala, você acha que ele tentou, mas não conseguiu, certo? A verdade é que a tentativa e a experiência da tentativa já é um abuso”.

O que aconteceu? “Eu realmente não quero descarrilar o livro contando histórias sobre Harvey.” Mas foi um abuso de direitos? “Sim. Foi algo além de uma coisa passageira, foi algo de que eu precisei escapar. Eu me afastei e avisei as outras pessoas sobre ele. Lembro-me de contar para o Jonny, meu primeiro marido – que era ótimo nisso – para espalhar a notícia para outras pessoas – disse para não deixar as meninas ficarem sozinhas com ele. Fui convidada para trabalhar no filme “O Aviador”, mas recusei porque ele estava envolvido. Nunca mais me associei ou trabalhei com ele. Foi difícil para mim quando Brad o fez.”

Em 2009, Pitt estrelou “Bastardos Inglórios”, dirigido por Quentin Tarantino e co-produzido pela “Weinstein Company”. Em 2012, ela diz que Pitt contratou Weinstein para trabalhar como produtor do thriller “O Homem da Máfia”, que a Weinstein Company posteriormente distribuiu. Ao fazer isso, Jolie sentiu que ele estava minimizando o abuso sexual que ela havia sofrido. “Nós brigamos por isso. Claro que doeu”, disse Jolie sobre Pitt ter ficado feliz em trabalhar com Weinstein, apesar de saber que ele havia abusado dela. Ela evitou comparecer aos eventos promocionais do filme.

Neste momento, Jolie está bebendo algo de uma garrafa enquanto conversa comigo. O que é? “É kombuchá. Não é álcool – não ainda!” Ela ri e toma outro gole. Eu pergunto se seus filhos estão interessados em ativismo. Ela me diz que eles são todos muito diferentes, mas que é difícil para eles não serem por causa da forma como a família surgiu.

“Grrrrrrrrrrrrr,” Dusty rosna.

“Dentro do entendimento de que eles são todos membros de uma mesma família, existe uma grande consciência que teve que nascer durante todos esses anos, em que eles cresceram juntos, aprendendo um com o outro, conversando sobre adoção, raça e família. Tiveram que escutar pessoas perguntarem: ‘Como vocês podem ser irmãs? Vocês não são da mesma cor’, quando eram crianças, por exemplo. Eles foram para os países uns dos outros, onde eram a única pessoa da mesma origem naquele país, e se sentiram como se fossem de fora, mas ainda assim da mesma família.”

Pergunto a Jolie se ela sempre quis adotar. Não, ela diz que quando ela estava crescendo, não queria filhos. “Eu nunca quis ser babá, nunca tive bonecas, então é hilário que terminei com seis filhos.” O que você tinha em vez de bonecas? “Eu gostava de brincar de escritório. Então, no final da minha adolescência, entendi o que era a adoção e a ideia de que existiam crianças em todo o mundo que haviam se tornado órfãs, aquilo simplesmente fez todo sentido para mim. Eu nunca tive essa ideia de ‘meu próprio sangue’”. Apesar de ter dado à luz a três filhos com Pitt, a genética nunca lhe interessou. “Sempre formamos uma família por estarmos juntos e crescermos juntos, certo?” Ela frequentemente conclui uma frase com a palavra “certo?” – que é, em parte pergunta, e em parte declaração.

Em 2013, Jolie escreveu um artigo para o jornal “New York Times” revelando que ela havia se submetido a uma dupla mastectomia preventiva, pois é portadora de uma mutação genética no gene “BRCA1″, que matou sua mãe e que colocou Jolie em um alto risco de desenvolver câncer de mama e ovário. Dois anos depois, ela escreveu outro artigo anunciando que também havia se submetido a uma cirurgia para remover os ovários e as trompas de falópio. Foi inédito ouvir uma celebridade de Hollywood, no auge de sua carreira, abordando essas questões. Mas isso provou ser um desafio. Um ano depois, através de um relatório publicado no Reino Unido, descobriu-se que a decisão de Jolie de falar em público sobre sua dupla mastectomia, gerou uma duplicação no número de testes genéticos que avaliam o risco de câncer de mama.

Ir a público é uma forma de ativismo? Eu pergunto. Bem, ela diz que certamente não usaria essa palavra. Na verdade, acrescenta, ela raramente usa a palavra para isso. Foi apenas uma forma que encontrei de dizer às pessoas: ‘Se a cirurgia preventiva fez sentido para mim, será que pode fazer sentido para você também?’ Ao longo da minha vida, nunca tive a confiança de que, se eu fizer alguma coisa, fará a diferença para alguém. Eu não penso em mim dessa forma. Era apenas eu pensando: Se minha mãe tivesse ficado sabendo disso, fizesse essa cirurgia e tivesse lido um artigo de opinião como este, ela ainda poderia estar viva. Portanto, eu realmente senti que deveria escrever aquilo, porque talvez a mãe de alguém vá ler.”

Digo a ela que acho fascinante a maneira polarizada como ela é retratada – seja como uma santa ou como uma louca, uma arqui manipuladora. (foi sugerido que ela estaria lutando pela custódia dos filhos simplesmente porque quer se mudar da América – algo que ela nega.) “Acho que as pessoas, às vezes, só precisam de alguém que seja aquilo o que elas querem que seja. O que importa, para mim, é que se as pessoas pensarem isso ou aquilo sobre mim, vai afetar minha capacidade de lutar pelos direitos das crianças? Isso vai afetar minha capacidade de trabalhar com o Muhammad e de ajudá-lo? Se você realmente acha que sou louca, isso é um problema, porque você pode não ouvi-lo da forma que deveria e pode não me dar valor quando digo o quão importante ele é ou este livro é.”

Enquanto ela fala, noto como ela parece cansada. Embora se recuse a discutir detalhes sobre seu divórcio, ela disse que a experiência foi traumática e a deixou se sentindo “quebrada”. O que os últimos cinco anos tiraram dela? Há uma longa pausa. Ela segura o rosto com as mãos e parece prestes a cair no choro. “Quero dizer, de certa forma, foi a última década. Existem muitas coisas que não posso dizer”, repete ela. “Eu acho que, no final do dia, mesmo que você e apenas algumas pessoas que você ama, sejam os únicos que sabem a verdade sobre sua vida, sabem pelo o que você lutou, ou sobre o que você sacrificou, ou o que você sofreu, você está em paz com isso, independentemente do que esteja acontecendo ao seu redor.”

Foi difícil sair de tudo isso em paz consigo mesma? “Eu ainda não consegui sair disso”, diz ela calmamente. Suponho que o que estou perguntando de forma desajeitada é: Como você está? Ela parece ainda mais chateada. “É realmente difícil de responder.” Outra pausa. “Como eu estou? Estou percebendo que às vezes você pode sobreviver às coisas, mas não sabe como se sentir e viver da mesma maneira. Portanto, é mais sobre estar aberta. Estou realmente tentando ser aberta como ser humano novamente.”

Descobrir que a Convenção Sobre os Direitos da Criança não foi ratificada pelos Estados Unidos deu a ela um senso de propósito: em vez de simplesmente lutar por seus filhos, ela pode se ver com uma causa ainda maior relacionada aos direitos humanos. Ela está tentando dar um toque positivo à sua situação. “Tem sido tão horrível que quase tenho que ver como uma dádiva estar em uma posição de ser capaz de lutar contra este sistema. Não começou com aquela violação [o incidente do avião]. É muito mais complicado do que isso.” Ela diz que a falta de ratificação da Convenção teve um impacto significativo em sua batalha: “Meu filho de 17 anos, por exemplo, teve sua voz negada no tribunal”.

Jolie é complexa e às vezes contraditória. Ela me diz que quer falar sobre tudo isso; no minuto seguinte, ela muda de ideia. “Não é que eu quero falar sobre determinada coisa, porque, na verdade, eu só quero que minha família seja curada. E eu quero que todos sigam em frente – todos nós, incluindo o pai deles. Eu quero que nos curemos e tenhamos paz. Sempre seremos uma família.” Não é apenas Jolie que é complexa; é a situação. É difícil ver como, até mesmo ela, poderia continuar com sua alegação de violência doméstica e conseguir chegar a uma solução pacífica.

Quando menciono como ela parece chateada, ela admite que estava realmente mais emotiva desde que viu o Talibã invadir a cidade de Cabul. “Esta manhã, eu chorei muito pensando no Afeganistão. Este país esteve no começo para mim, 20 anos atrás – aquelas primeiras viagens quando você conhece pessoas e realmente se conecta. Você conhece crianças pequenas, vê as promessas feitas, os esforços feitos, a confiança dada, vê tudo, então você os vê sendo colocados em caminhões para serem enviados de volta e, agora, você os vê em Cabul, nas escolas, e você fica com uma sensação de dor, medo, morte, horror, traição e trauma. É nojento. Diz muito sobre o mundo em que vivemos hoje. Diz muito sobre onde estamos.”

Mas, ao mesmo tempo, isso a faz pensar em Muhammad e nos três outros ativistas que conhecemos, lutando ferozmente por um mundo melhor. Isso a faz pensar em todas as negociações terríveis que os políticos fazem que levam a resultados como o Afeganistão. Isso a faz pensar em quando ainda era jovem, recusando-se a ceder às convenções e em todas aquelas pessoas que a rejeitaram nos anos seguintes, por acreditar que a justiça e a humanidade podem vencer, em vez da realpolitik. “Não”, ela diz, com sua autoconfiança restaurada, “eu não sou louca”.

Fonte: The Guardian

 

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