Jolie entrevista Bibi Aisha para a TIME
28 de fevereiro de 2023
Nesta terça-feira, dia 28 de Fevereiro de 2023, a revista “TIME” compartilhou em seu website oficial uma entrevista exclusiva feita pela ativista e cineasta estadunidense – Angelina Jolie – com Aisha Mohammadzai, também conhecida como Bibi Aisha. Jolie ainda escreveu o artigo, que foi traduzido na íntegra pelo Angelina Jolie Brasil. Confira!
Escrito por Angelina Jolie
Bibi Aisha tinha 14 anos quando seu pai a obrigou a se casar com um combatente do Talibã. Ela fugiu do abuso praticado por ele, mas acabou sendo presa novamente. Ela se lembra da terrível noite em que foi levada para o alto de uma montanha, com seus pés e mãos amarrados, enquanto seu marido e outros membros do Talibã discutiam se ela merecia ser mutilada ou executada. Eles cortaram o nariz e as orelhas de Aisha e a deixaram para morrer, mas ela, de alguma forma, encontrou forças para encontrar ajuda.
“Uma espécie de poder caminhou ao meu lado naquela noite”, ela me disse. Aparecer na capa da TIME e ter a oportunidade de contar sua história a respeito dos riscos causados pela guerra no Afeganistão com relação às mulheres, fez com que ela conseguisse um novo lar nos Estados Unidos.
Durante anos de dolorosas cirurgias reconstrutivas, ela aprendeu a ler, escrever e a falar inglês. Hoje, a foto da qual ela mais se orgulha está em sua carteira de motorista. Mas o Afeganistão permanece em seus pensamentos: “Ninguém está seguro com o Talibã.” Ela conversou comigo de Maryland, onde estuda para se tornar enfermeira.
Tive a sorte de conhecer mulheres extraordinárias como você, que realmente moldaram muito quem eu sou hoje e no que acredito sobre a vida. Muita gente não conhece a sua história. Você pode nos contar sobre isso?
Meu pai arranjou um suposto casamento para mim, e eu acabei me casando com alguém que era do Talibã. Eu vivi ao lado dele e de outros membros por quase cinco anos. Eles abusavam de mim todos os dias. Eu não tinha nenhum direito. Resolvi fugir e fui para a casa dos meus vizinhos. A polícia local acabou prendendo meus vizinhos, ocasião em que eu fui presa também. Eu não tive outra opção, a não ser que quisesse voltar a viver com os membros do Talibã. Então, eu acabei ficando feliz por ter sido presa. Fiquei na prisão durante cinco meses. Lá, ninguém me batia e eu recebia uma boa comida. Até o momento em que meu suposto sogro foi até lá, subornou a polícia e me tirou da prisão. Implorei à polícia que me deixasse ficar. Mas eu não tinha outra escolha. E então meu suposto marido apareceu e me levou para uma região de montanhas, onde amarraram minhas mãos e meus pés. Primeiro eles cortaram uma orelha, depois a outra orelha e depois meu nariz. E então ele disse: “Não nos importamos com você. Queremos deixar você aqui para morrer.” Eu decidi andar. Fui até a casa do meu tio e ele não quis abrir a porta para mim. Mas algo estava me dando força naquela noite. Bati nas portas e contei minha história. Decidi que queria sobreviver. Fui a um hospital americano e fiz meu tratamento por dois meses e meio. Eles me trataram como um membro da família e salvaram minha vida. Alguém na América aceitou meu caso e disse que faria minha cirurgia. Passei nove meses em um abrigo. Eu não tinha ideia do que iria acontecer comigo e, de repente, a revista TIME veio até mim e tirou uma foto minha. Eles abriram as portas para mim.
Você foi muito corajosa em aceitar mostrar sua maravilhosa pessoa ao mundo e contar sobre o que foi feito com você. Agora, após a tomada do Afeganistão, as pessoas que lhe prejudicaram estão no comando. Tudo o que descobrimos e ficamos indignados com relação ao que foi feito no passado, sabemos que está acontecendo novamente, todos os dias.
É muito difícil para mim. Eu me coloco no lugar de uma mulher afegã. Elas tiveram liberdade durante 20 anos e, de repente, tudo se fechou novamente para elas. E elas não têm direitos.
Fica claro que, aqueles que proíbem a educação das mulheres, fazem isso porque são cheios de medo.
Quando você não recebe educação, você não consegue fazer nada na vida. Meu professor diz que: “quando você aprende matemática e álgebra, está dando um tapa na cara do Talibã.” Isso me deixou tão feliz. A coisa mais importante que você pode fazer é educar as mulheres para que elas possam se ajudar.
Também conheço grandes maridos e grandes pais afegãos que realmente protegeram e amaram as mulheres em suas vidas.
Os meninos também não estão seguros. Eu vi com meus próprios olhos quanta violência os meninos enfrentavam quando eu morava lá. Os meninos pequenos, de 10 ou 11 anos, eram estuprados o tempo todo por alguns membros dos talibãs.
Você passou por muita crueldade na sua vida. Mas parece que existem muitas pessoas que te amam muito.
Quando vim para Maryland e conheci meus pais adotivos, não contei toda a minha história para eles. Eles simplesmente me aceitaram. Hoje estou cercada por muitas pessoas boas.
Tenho a sensação de que você vai continuar estudando por toda sua vida.
Este é o meu objetivo. Quero ser enfermeira para poder ajudar as pessoas. Já fiz 31 cirurgias, o que significa que tenho muita experiência no mundo médico. Quero ajudar as pessoas que estão sofrendo e dizer a elas: se eu consegui superar minhas horas mais sombrias, você também consegue.
Fonte: TIME
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