Jolie fala sobre as crianças e o COVID-19 em artigo
9 de abril de 2020
Em um artigo publicado no dia 09 de Abril de 2020 pela renomada revista TIME, Angelina Jolie escreveu sobre a pandemia do COVID-19 e a vulnerabilidade das crianças ao redor do mundo. Confira a matéria traduzida na íntegra pelo Angelina Jolie Brasil.
Escrito por Angelina Jolie
Das muitas maneiras pelas quais a pandemia está nos fazendo repensar nossa humanidade, nenhuma é mais importante ou urgente do que a proteção geral das crianças. Elas podem não ser tão suscetíveis ao vírus quanto outros grupos, mas são especialmente vulneráveis a muitos dos impactos secundários da pandemia na sociedade.
As consequências econômicas do COVID-19 foram rápidas e brutais. As proibições e os pedidos para que as pessoas permaneçam em suas casas resultaram na perda de empregos e insegurança econômica, aumentando a pressão e a incerteza para muitas famílias. Sabemos que o estresse em casa aumenta o risco de violência doméstica, seja em uma economia desenvolvida ou em um campo de refugiados.
Na América, estima-se que 1 em cada 15 crianças é exposta à violência doméstica a cada ano – 90% delas são testemunhas oculares da violência. Uma média de 137 mulheres em todo o mundo são mortas por um parceiro ou membro da família todos os dias. Nunca saberemos em quantos desses casos há uma criança no quarto ao lado – ou no próprio quarto.
Isolar uma vítima da família e dos amigos é uma tática bem conhecida de controle por parte dos agressores. Isso significa que o distanciamento social necessário pode, inadvertidamente, alimentar um aumento direto no trauma e no sofrimento de crianças vulneráveis. Já existem relatos de um aumento na violência doméstica em todo o mundo, incluindo assassinatos violentos.
Chega no momento em que as crianças são privadas das próprias redes de apoio que as ajudam a lidar com o problema: de seus amigos e professores de confiança, às atividades após a escola e às visitas à casa de um parente querido que proporcionam uma fuga de seu ambiente abusivo.
O COVID-19 separou as crianças de seus amigos, da educação regular e da liberdade de movimento. Com mais de um bilhão de pessoas vivendo trancadas em casa ao redor do mundo, tem havido muito foco em como evitar que as crianças falhem na questão da educação, bem como em elevar seus espíritos e mantê-las alegres durante o isolamento.
Para muitos estudantes, as escolas são uma fonte de oportunidades e uma espécie de escudo, oferecendo proteção – ou pelo menos uma suspensão temporária – da violência, exploração e outras circunstâncias difíceis, incluindo exploração sexual, casamento forçado e trabalho infantil.
Não trata-se apenas do fato de que as crianças perderam suas redes de apoio. O isolamento também significa menos olhos adultos voltados para suas situações. Em casos de abuso infantil, os serviços de proteção são mais frequentemente acionados por terceiros, como professores, orientadores, coordenadores de programas após a escola e por treinadores.
Tudo isso gera a questão: o que estamos fazendo agora para proteger as crianças vulneráveis de sofrerem danos durante o confinamento que as afetarão pelo resto de suas vidas?
Estávamos despreparados para esse momento porque ainda precisamos levar a proteção das crianças suficientemente a sério como sociedade. Os impactos profundos e duradouros do trauma na saúde das crianças são pouco compreendidos e muitas vezes minimizados. As mulheres que encontram forças para contar a alguém sobre seus abusos, costumam ficar chocadas com a quantidade de pessoas que optam por não acreditar nelas, dão desculpas por comportamentos abusivos ou as culpam. Muitas vezes, elas não estão preparadas para o risco de serem reprovadas pelo sistema de bem-estar infantil com poucos recursos, ou para encontrar juízes e outros profissionais do direito que não são treinados para lidar com trauma, com relacionamentos abusivos e que não levam a sério os efeitos gerados nas crianças.
Há sinais de esperança. No meu estado natal, Califórnia, a Dra. Nadine Burke Harris argumentou que a violência doméstica e outras Experiências Adversas na Infância (Adverse Childhood Experiences ACEs) são os principais componentes dos problemas de saúde mais destrutivos e dispendiosos dos Estados Unidos. Ela está liderando uma unidade que busca realizar uma triagem de rotina nas crianças, que passam por essas experiências adversas, pelos prestadores de cuidados de saúde visando possibilitar intervenções precoces.
Embora estejamos fisicamente separados um do outro sob a quarentena, podemos fazer questão de ligar para familiares ou amigos, principalmente onde sabemos ter alguém que seja vulnerável. Podemos nos educar sobre os sinais de estresse e violência doméstica, saber o que procurar e com que seriedade devemos ver aquilo . Podemos ajudar os abrigos locais de nossas cidades que recebem vítimas de violência doméstica.
A Parceria Global para Acabar com a Violência contra as Crianças (Global Partnership to End Violence Against Children) oferece vários recursos para ajudar a proteger as crianças durante a pandemia, incluindo guias online sobre como mantê-las seguras e sobre como conversar com as crianças a respeito de questões difíceis. A Rede de Atendimento Infantil (Child Helpline Network) pode encaminhar pais, ou qualquer pessoa preocupada, a um número de telefone para pedir conselhos e informações. E existem sites que podem ajudar se você tiver preocupações sobre seu próprio relacionamento.
Costuma-se dizer que é preciso uma vila para criar um filho. Será necessário um esforço de todo o país para oferecer às crianças a proteção e os cuidados que merecem.
Fonte: TIME
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