Jolie escreve artigo sobre violência doméstica
27 de junho de 2023
A revista médica “American Journal of Nursing” publicou recentemente um artigo exclusivo escrito por nossa musa inspiradora – Angelina Jolie. Nele, a cineasta e ativista humanitária fala sobre a violência doméstica e as questões relacionadas à detecção de lesões físicas em vítimas que possuem cor de pele escura. Confira o conteúdo traduzido na íntegra pelo Angelina Jolie Brasil!
Escrito por Angelina Jolie
Abordando as desigualdades na área da saúde em sobreviventes de violência doméstica As pesquisas médicas, as imagens e os treinamentos continuam centrados na pele branca, não em como as lesões se apresentam de maneira diferente em pacientes com tom de pele mais escuro. Como resultado, os profissionais médicos – incluindo enfermeiros e legistas – muitas vezes deixam de notar os ferimentos, dependendo da raça e etnia do paciente. Como mãe de filhos de várias etnias, vi meus filhos de cor serem diagnosticados erroneamente, às vezes de maneira que colocava sua saúde em risco.
Em busca de soluções, visitei o laboratório da enfermeira forense Katherine N. Scafide para entender melhor uma das várias soluções tecnológicas que estão sendo desenvolvidas para a detecção de equimoses e hematomas. Quando ela passou um tipo de luz específica sobre a pele de sua colega, os hematomas que eram invisíveis a olho nu, apareceram. O dispositivo simples e portátil aplicou uma espécie de “luz alternativa” – neste caso, luz violeta com lente amarela – em direção à pele. A técnica é até cinco vezes mais eficaz na detecção de hematomas do que a luz branca, mesmo quatro semanas após ao surgimento da lesão.
As equimoses são um dos tipos mais comuns de lesões nos tecidos moles experimentados por sobreviventes de agressões. No entanto, ainda hoje, a detecção e o diagnóstico de hematomas geralmente são feitos à vista e com luz natural. Isso não leva em conta os ferimentos causados aos sobreviventes que possuem pele de cor escura, que podem ser pouco visíveis ou totalmente invisíveis a olho nu, apesar de causarem danos e dores significativas.
Para as vítimas de agressão, a evidência de lesão é muitas vezes crucial para o acesso à proteção legal e tratamento de saúde física e mental, tornando o papel dos profissionais de saúde algo bem crítico. Sem o uso da melhor tecnologia disponível para detectar as equimoses, os sobreviventes de violência que possuem cor de pele escura estão em desvantagem significativa em terem seus ferimentos devidamente identificados e documentados, correm maior risco de novos abusos e possuem menos chances de receber justiça ou cuidados médicos. Os hematomas geralmente levam 48 horas para aparecer após uma agressão, fato que também não é levado em consideração pelos socorristas.
Sejamos claros: o viés racial na coleta de evidências forenses é apenas um aspecto de questões sociais muito maiores que levam a desigualdades na assistência à saúde e a resultados de saúde com viés racial. Muitos fatores contribuem para o impacto inaceitável e desproporcional da violência doméstica nas comunidades negras na América. Todos esses fatores devem ser abordados. Este é um passo que devemos dar imediatamente e que está ao nosso alcance.
Os enfermeiros estão em uma profissão confiável de cuidado e tratamento na linha de frente. As enfermeiras com quem conversei apontaram que, muitas vezes, evidências cruciais de agressões não são registradas. Além de rastrear e documentar a violência, as enfermeiras podem e aconselham os pacientes e os pais de crianças agredidas a respeito das alterações antecipadas de coloração e inchaço nos locais de lesão e ajudam a obter evidências nas 48 horas após o contato inicial (e em intervalos adicionais se a vítima concorda).
Com base na experiência e em tudo o que aprendi com os especialistas, fui compelida a defender que um programa de subsídios para tecnologia forense imparcial fosse incluído na re-autorização da Lei de Violência Contra as Mulheres de 2022, que agora foi sancionada nos Estados Unidos. Este programa de subsídios é uma oportunidade de apoiar os profissionais de saúde em seu crítico trabalho. A tecnologia avançada deve estar disponível universalmente como parte de um esforço para salvar vidas e melhorar os resultados legais para os sobreviventes de violência, incluindo métodos para detectar e medir o calor no local da lesão, independentemente do tom da pele.
Refletindo pessoalmente, quando minha filha Zahara, que é da Etiópia, foi hospitalizada em razão de um procedimento médico, a enfermeira me disse para ligar “se ficar rosado nas regiões próximas de suas incisões”. Fiquei olhando fixamente para ela, sem ter certeza se ela havia entendido o que havia de errado com o que ela havia dito. Quando ela saiu do quarto, conversei com minha filha, ambas sabíamos que teríamos que procurar sinais de infecção com base em nosso próprio conhecimento, não no que a enfermeira havia dito, apesar de suas indubitáveis boas intenções.
Mesmo que minha família tenha acesso a cuidados médicos de alta qualidade, diagnósticos simples são perdidos por causa da raça e da contínua priorização da pele branca na medicina. Em nível social, as disparidades raciais na assistência à saúde afetam os resultados de milhões de pessoas. Da tecnologia para melhorar a diversidade até a representação na pesquisa e treinamento médico, já passou da hora de novas soluções serem adotadas.
Fonte: American Journal of Nursing
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