[Entrevista] A visionária: Angelina Jolie
22 de novembro de 2014
Escrito por Adam Rathe para a revista DuJour
Fotografada por Francesco Carrozzini
Louis Zamperini sabia uma coisa ou outra sobre esperar. O corredor olímpico norte americano que virou oficial da força aérea, passou 47 dias em uma balsa no oceano depois de sofrer um acidente de avião em 1943, sendo que, posteriormente, ele sobreviveu, ainda, por dois anos como prisioneiro de guerra no Japão. Ainda assim, quando Zamperini vendeu sua história aos estúdios da Universal Pictures em 1957, o que ele mal sabia é que ela demoraria mais de 50 anos para ser contada.
O filme estreia no dia de Natal nos Estados Unidos, mas a espera terá chegado ao fim. Quando “Unbroken” chegar aos cinemas, a história de Zamperini será exibida para espectadores em todo o mundo. Além de mostrar ao mundo essa incrível história, o filme dará ao público a oportunidade de dar uma “olhada” no interior de outra criatura extremamente impressionante: a diretora Angelina Jolie.
“Eu estava procurando alguma coisa para estudar e para fazer como diretora”, disse Jolie, à beira da piscina de uma casa que fica na pequena ilha de Gozo, em Malta. “Dirigir é muito diferente de atuar, porque dirigir é algo que toma mais de dois anos da sua vida e por isso, tem que ser algo realmente importante – que realmente importe – de uma forma diferente.”
Pelos estúdios da Universal Pictures, foi apresentada à Jolie – que teve sua estreia na direção no filme “Na Terra de Amor e Ódio”, lançado em 2011 – uma enorme lista de ideias disponíveis e mais um monte de poeira; e foi nisso que ela encontrou o que estava procurando.
“Toda vez que você vai até um estúdio, eles te mostram os projetos que estão no limbo e cheguei a ver quatro linhas de Unbroken. Quando cheguei em casa eu disse para o Brad, ‘Fiquei realmente curiosa por este filme – que conta uma história de triunfo do espirito humano, de fé, de encontrar o perdão; e a vida deste homem parece muito interessante’. E Brad disse, ‘Querida, esse projeto esteve rodando por aí durante anos’”.
Jolie, no entanto, não perdeu o interesse. Quando ela estava na metade do livro escrito em 2010 por Laura Hillenbrand, também chamado “Unbroken”, ela soube que tinha que realmente tinha que fazer o filme.
“Eu batalhei por ele durante meses”, disse Jolie. “Isso fez com que eu quisesse menos fazer um filme e quisesse mais me tornar amiga de alguém como o Louie. Eu senti que precisava entrar nessa jornada e que eu me tornaria uma pessoa melhor se o fizesse. Eu estava implorando não só pelo fato de querer ser diretora – eu estava implorando para ter a oportunidade de passar dois anos da minha vida focada em Louis Zamperini”.
De acordo com o co-presidente de produção dos estúdios da Universal, Peter Cramer, os anos de Jolie na frente das câmeras e o seu carinho pelo trabalho lhe renderam o cargo de diretora.
“Eu acho que ninguém via a Angelina Jolie como se fosse uma diretora recém-formada na escola de cinema. Ela teve, obviamente, uma enorme quantidade de experiências na indústria do cinema antes de se tornar diretora e isso fez muito bem a ela quando decidiu ficar atrás das câmeras. Nós não a víamos como uma diretora recém formada mais do que as pessoas fizeram quando viram Clint Eastwood e Robert Redford pela primeira vez atrás das câmeras”.
Assim, em 2013, Jolie teve seu desejo realizado e partiu para a Austrália para quase quatro meses de filmagens.
“Foi uma enorme oportunidade. Mais do que eu podia imaginar”, disse Jack O’Connell – um ator inglês de 24 anos que conseguiu o papel de Louis Zamperini. “Eu estava batendo em todas as portas, esperando alguém me dar a chance de me destacar e Louie foi simplesmente perfeito para isso”.
Escolher o ator principal – um papel que exigia uma busca internacional – não foi fácil. “Na hora de escolher quem iria interpretar Louie, sabíamos que precisava ser alguém que fosse um homem de verdade, mas também alguém que desse um forte sentido para a família, que fosse talentoso e de grande profundidade emocional”.
O’Connell, um veterano da série adolescente britânica “Skins” e que estrelou em vários filmes independentes, conseguiu a façanha. “Jack tinha essa combinação de luta, poder de fogo e espírito”, disse Jolie. “Assim que eu o conheci, soube que ele iria ser o Louie.”
Ela levou para o elenco do filme vários outros jovens atores incluindo Domhnall Gleeson, Garrett Hedlund e o cantor japonês Miyavi.
Apesar da divulgação do filme ter se tornado um perfeito “foguete” para a carreira de O’Connell – que apareceu em tantas listas de celebridades que seu próximo evento poderia até ser na NASA – o trabalho não foi nada fácil. Para interpretar Zamperini como um frágil prisioneiro de guerra, O’Connell teve que enfrentar uma dieta de 800 calorias por dia. Já para interpretá-lo como um atleta olímpico, O’Connell teve que treinar para se tornar um corredor olímpico internacional.
“É difícil citar alguma cena específica já que o filme inteiro foi muito brutal,” disse O’Connell. “A pior parte das filmagens aconteceu na primeira metade do filme. Estávamos filmando as cenas finais no campo de prisioneiros de guerra e havia muito carvão; por conta disso, tudo estava enegrecido. Havia dias em que eu não podia fazer nada fora da cena, tudo para preservar minha energia. Depois, quando tive que interpretar um atleta olímpico, eu, estupidamente, achei que seria mais fácil do que interpretar um prisioneiro de guerra, mas não foi. Isso, realmente, foi bem difícil para mim.”
As filmagens também foram emocionalmente pesadas. Pouco antes de chegar à Austrália, O’Connell – que na adolescência, perdeu o pai para um câncer de pâncreas – descobriu que um de seus melhores amigos havia sido diagnosticado com câncer de fígado. Lidar com o stress fora das telas deu a O’Connell e a Jolie – que assumiu publicamente ter se submetido a uma dupla mastectomia preventiva e que perdeu a mãe para um câncer de ovário em 2007 – a oportunidade de aprofundar mais seus relacionamentos pessoais.
“Eu estava na pior, com a dieta e com os efeitos da preparação, no entanto, a única forma de eu ver meu amigo era fazendo uma viagem. E Angie arranjou um helicóptero. No mesmo fim de semana, ela chamou meus amigos e conhecidos mais próximos para jantar comigo. Algo que foi além do que um diretor normalmente faz. Isso me fez pensar que eu estive fazendo merda durante os dois meses antes de começar a filmar e então, depois disso, tudo o que eu mais queria era estar nos sets para retribuir o favor. Essa não foi uma relação convencional de ator-diretor e o fato dela fazer com que eu visse que isso seria um investimento em dois sentidos, foi muito importante”.
Para Jolie, que é mãe de seis filhos e trabalhadora humanitária internacional, dirigir um grupo de jovens em um filme de guerra foi uma experiência que testou sua determinação.
“Todos os meninos tinham que parecer estar morrendo de fome – até os figurantes – e tivemos dias em que 200 rapazes ficaram em pé embaixo do sol,” lembra Jolie. “O meu lado materno queria parar e colocar todo mundo embaixo de uma tenda e dar muita água. Meu outro lado tinha que ser forte e pressioná-los para conseguir fazer o trabalho”.
Enquanto os atores eram pressionados a ir além de seus limites, Jolie diz que dirigir “Unbroken” fez com que ela superasse a si mesma. Em um determinado dia, ela tinha um grande grupo de atores parado embaixo do sol esperando que as sombras das nuvens ficassem perfeitas para começar a filmar. Jolie disse que seu instinto dizia a ela para dar um intervalo, mas um consultor militar que acompanhava as filmagens ofereceu uma solução diferente.
“Ele fez com que todo mundo prestasse atenção e depois, fez com eles começassem a fazer flexões”, disse ela com os olhos incrivelmente incrédulos mesmo tanto tempo depois. Eu pensei, ‘Ah não… ’, mas eles fizeram as flexões; foram testados, pressionados para um propósito e 10 minutos depois, estavam todos sorrindo”.
Ela acrescenta: “Eu aprendi algo sobre os homens neste dia. Aprendi que um desafio é bom para todos e então eu nunca mais fiquei acanhada em exigir demais, sabendo que todos nós tínhamos um propósito real”.
As lições que Jolie aprendeu não ficaram por ali. Seus três filhos foram beneficiados também. “Na minha mente, eu queria fazer um filme que pudesse ajudar meus meninos a se tornarem homens melhores”, disse ela. “Eles conhecem a história de Louie e então eu posso dizer que não é ruim ser alguém “com muito poder de fogo” – o que importa é o que você escolhe fazer com esse fogo”.
Quanto ao que Jolie decidiu fazer com seu “próprio poder de fogo”, a direção parece ter sido a escolha certa. Depois de passar anos na frente das câmeras e receber uma enorme quantidade de prêmios – incluindo um Oscar pelo filme “Garota, Interrompida” – ela diz que seu foco, de agora em diante, vai ser o dirigir filmes e não de estar neles.
“Eu nunca me senti confortável como atriz. Eu nunca amei estar em frente às câmeras. Eu nunca achei que um dia eu fosse dirigir, mas eu espero conseguir fazer uma carreira na direção, porque eu sou muito mais feliz,” disse ela.
Seu plano é abrir mão da atuação por completo?
Ela sorri. “Absolutamente”.
Mas não ainda. Na verdade, o local em que estamos sentados conversando é parte dos sets de filmagens de seu novo projeto, “By the Sea”, que contará uma história de amor que foi escrita e dirigida por Jolie – e que também irá estrelar seu parceiro de longa data e marido, Brad Pitt (o projeto parece ser algo de família: o filho de 13 anos do casal, Maddox, também está trabalhando no filme como assistente de produção. “É algo muito estranho”, disse Jolie a respeito).
“Comparado com “Unbroken” esse filme é um passeio no parque,” disse Jolie sobre o filme, que irá se passar na década de 70 e que mostrará um casal americano e seu complicado casamento, durante uma viagem à França. “O que está sendo mais complicado é dirigir eu mesma e Brad. É um material pesado, dramático e nós estamos equilibrando as coisas”.
Esta será a primeira vez em que o casal, que se conheceu nos sets do filme “Sr. & Sra. Smith” em 2005, irá trabalhar junto desde o casamento em agosto deste ano. Não que as coisas tenham mudado muito para eles – “Eu acho que, como estávamos bem, as coisas continuam igual como eram antes”, disse Jolie sobre sua vida de casada. “Mas trabalhar um do lado do outro será algo que teremos que acostumar”.
“É um filme pesado e não está sendo fácil para nós”, disse ela. “Mas mesmo quando os dois estão lutando juntos, quando os dois estão na batalha juntos, não se espera que vai ser realmente fácil. Nós estamos nos desafiando e isso é realmente uma coisa boa”.
Desafios, é claro, fazem parte de qualquer processo criativo. E enquanto “Unbroken” veio com uma enorme quantidade de dificuldades, talvez nenhuma tenha sido mais pesada do que a morte de Louis Zamperini que aconteceu em Julho deste ano.
“Eu fiquei aterrorizado quando eu soube que ele tinha falecido,” disse Jack O’Connell.”Eu sempre imaginei nós dois no tapete vermelho e que eu estaria nos fundos enquanto o show seria do Louie. Agora, esse não mais vai ser o caso, mas nós temos que mostrar ao mundo que este filme foi feito em sua homenagem. Uma homenagem a este homem que não está mais entre nós”.
Jolie compartilha o sentimento. “A parte mais difícil de fazer o filme para mim, foi mostrá-lo para Louie no hospital e ter de ver ele assistir sua própria vida,” disse ela. “Ele nos deu tanta coisa e nos inspirou tanto, mas assim como foi triste perdê-lo, sou muito grata por ter tido a oportunidade de conhecê-lo”.
Acima de tudo, Jolie diz que está honrada por ter sido dada a ela, a oportunidade de contar a história de Zamperini e de oferecer a ele, a imortalidade, mesmo que seja apenas em um filme.
“Eu ainda não consigo acreditar que eu fiz este filme,” disse ela. “Dirigir é algo tão novo para mim e sou tão tímida com relação a isso porque eu ainda estou aprendendo. Eu irei me sentir melhor quando o público começar a assistir o filme. Acho que nós estamos no caminho certo, mas não estou respirando tranquilamente ainda”. – Fonte: DuJour
Fotos:
• PHOTOSHOOTS (ENSAIOS FOTOGRÁFICOS) > 2014 > FRANCESCO CARROZZINI (8x)
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