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Jolie fala sobre seu novo filme em entrevista

30 de agosto de 2017

Nesta terça-feira, dia 29 de Agosto, o site “Screen Daily” disponibilizou uma nova entrevista concedida por Angelina Jolie, na qual a cineasta fala sobre seu novo filme, “First They Killed My Father”.

Por Jeremy Kay

Angelina Jolie, atriz, cineasta e ativista dos direitos humanos, está lançando o projeto mais pessoal de sua carreira. Um filme que se passa na década de 70 e fala sobre o genocídio cambojano. Em uma entrevista exclusiva, ela falou ao “Screen Daily” sobre a estreia internacional de “First They Killed My Father” que irá acontecer durante o Toronto International Film Festival (TIFF) no dia 11 de Setembro deste ano.

Jolie entrou em contato com as memórias de Loung Ung através do livro best seller “First They Killed My Father: A Daughter of Cambodia Remembers”, 17 anos atrás quando ela participava das filmagens do filme “Lara Croft: Tomb Raider”. O livro custava em torno de “dois dólares e era uma espécie de livro de bolso, que você encontrava em qualquer lugar durante as viagens”. Através dele, Jolie foi para um lugar muito mais distante que uma Lara Croft pulando através dos templos e de florestas fumegantes poderia ir.

Para Jolie, o livro cristalizou a dignidade e o desespero testemunhados por ela no país do sudeste asiático de tal forma, fazendo com que ela retornasse repetidas vezes ao Camboja como ativista humanitária e, posteriormente, como uma cidadã residente.

Ung e Jolie se conheceram através do trabalho humanitário, quando Jolie retornou para o Camboja um pouco depois de gravar “Tomb Raider”. Certa vez, as duas se viram balançando em redes durante uma chuva de monção, enquanto conversavam durante a noite. “Nós ficamos amigas e ela tem estado em minha vida desde então”, disse Jolie.

Ung tinha cinco anos quando o Khmer Vermelho emergiu das selvas em 1975 para derrubar o governo de Lon Nol e transformar um país próspero em uma câmara de morte isolada. Ela e sua família de classe média deixaram a capital Phnom Penh e marcharam para os campos, assim como milhões de habitantes das cidades ao redor do país. Quando as tropas vietnamitas invadiram o Camboja e derrubaram o Khmer Vermelho em 1979, Ung perdeu seus pais e dois dos seus seis irmãos. Cerca de dois milhões de pessoas – quase um quarto de toda a população do Camboja – foram mortos.

Jolie e Ung adaptaram o roteiro do filme anos trás. Depois de vários esboços, em 2015 a Netflix concordou em financiar e produzir o projeto. Em junho daquele ano, Jolie pediu o apoio do cineasta cambojano Rithy Panh – diretor do documentário “A Imagem que Falta” indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Panh concordou e se tornou o produtor do projeto, assumindo a liderança durante meses e participando de reuniões com autoridades e ONGS, buscando conseguir permissão para o filme ser filmado em solo cambojano. Os cineastas tiveram que agir com cuidado. Ali não era a Tailândia, lembrou Jolie – local onde o filme “Os gritos do silêncio” havia sido gravado muitos anos antes. “Eu estava querendo levar um filme para o país e pedir para que as pessoas que viveram naquela época, relembrassem da história. Eu realmente não sabia se as autoridades iriam concordar”.

Revivendo o passado

Jolie estava preparada para reduzir a produção e trabalhar com qualquer espaço que as autoridades fornecessem. No entanto, ela conseguiu o que queria e as filmagens, que durariam 50 dias e que seriam feitas nas cidades de Siem Reap e Battambang, finalmente começaram em novembro de 2015.

“Então, é claro, eu cheguei nos sets e estava ao lado da minha amiga, tentando recriar cenas do pai dela sendo capturado e morto. Eu estava tentando refazer os passos da vida de uma pessoa.” Jolie faz uma pausa e sua voz meio que some. “Eu estava trazendo à tona. Eu estava trazendo de volta todas aquelas pessoas que morreram. Eu estava trazendo as irmãs dela de volta. E, é claro, sempre foram as cenas mais felizes que pareceram deixar Ung mais perturbada.”

Jolie e seus colegas internacionais do departamento de seleção de elenco treinaram figurantes locais, “prenderam” um grande número de figurantes, enfrentaram tarantulas e cobras nas selvas e, além disso, tiveram que evitar minas terrestres e outras munições não detonadas. “Por sorte, nós conseguimos finalizar as filmagens sem um único incidente nos sets”, disse Jolie.

Caminhar por um complicado terreno emocional foi mais difícil. A equipe local ajudou na comunicação com o elenco – que era, em grande parte, inexperiente – incluindo a pequena atriz Sareum Srey Moch, com 9 anos de idade, que interpretou o papel de Ung sem ter feito aulas de atuação e que impressionou sua diretora.

Moch participou de uma seleção de elenco que acabou sendo mal descrita pela recente matéria publicada pela revista norte americana “Vanity Fair. No artigo, ficou implícito que os diretores de elenco teriam emocionalmente manipulado as crianças durante as audições, provocando comentários raivosos contra Jolie.

A Enviada Especial do Alto Comissariado da ONU para os Refugiados e mãe de seis filhos emitiu, junto com Rithy Panh, um comunicado refutando tais afirmações. Quando isso foi novamente mencionado, Jolie disse que este assunto já estava encerrado. No entanto, ela fez questão de enfatizar que os tutores e os pais das crianças estavam presentes durante todas as audições e todas as partes sabiam que o processo envolvido era uma situação de “faz de conta”.

Ao longo das filmagens, o objetivo principal era proporcionar um ambiente terapêutico e catártico para o elenco do filme, através de uma equipe de ONGs, educadores, terapeutas e até desminadores. “O país realmente não fala sobre aquela época e todo mundo que tem em torno de 40 anos, se lembra,” disse Jolie. “Em uma cena, todos estavam vestidos com os uniformes do Khmer Vermelho e carregavam armas. As pessoas começaram a sentir algumas coisas, pois elas estavam se lembrando. Algumas pessoas conversaram sobre aquilo pela primeira vez.”

“First They Killed My Father” permitiu que Jolie se sentisse ainda mais próxima de um país onde ela viveu e trabalhou durante 14 anos. “Quando você dirige um filme é muito diferente de quando você atua. Quando você atua você tenta dar tudo o que você tem durante alguns meses da sua vida, onde você tem apenas um papel para interpretar,” afirmou Jolie. “Quando você dirige um filme, ele toma anos de sua vida e, portanto, deve ser algo realmente importante já que o projeto consome você”.

“Para mim, estas são coisas que realmente importam e estes filmes que eu dirigi são sobre tentar entender a desumanidade do homem para com outros homens; de como o espírito humano supera; de como você pode atravessar a escuridão e sair ainda mais forte e completo”, continua ela. “Quando você faz um filme sobre a história e a cultura de um país, você acaba se envolvendo em uma coisa muito especial”.

“Com este filme, em particular – desconsiderando o fato de que Maddox [o filho mais velho da atriz, adotado por ela no Camboja em 2001] sempre volta para lá comigo e termos uma casa lá – esta foi a primeira vez que ela conseguiu passar meses lá e estudar a história de seu país; ele conseguiu realmente estudar a fundo e compreender o que seus pais biológicos provavelmente passaram; ele conseguiu aceitar isso e descobrir quem era”.

Retribuindo

Um Maddox, agora com 16 anos, trabalhou como o produtor executivo do filme e esteve nos sets desde o começo, trabalhando longas horas nos rascunhos, na produção física e na parte de som. “Eu queria que ele trabalhasse duro e “se devolvesse” ao seu país”, disse Jolie, que não tem duvidas em dizer para quem ela fez este filme. “Eu fiz este filme para o Camboja. Eu fiz como uma espécie de agradecimento, como uma carta de amor. Nunca existiu um filme desta proporção que tenha chegado ao povo cambojano em sua língua nativa, mostrando ele como herói.”

Será que ela se preocupou com o fato de, por não ser uma cambojana nativa, ter o direito de fazer um filme como “First They Killed My Father” questionado pelo povo cambojano? “Provavelmente você teria que perguntar isso para os cambojanos. Em 2005, eu me tornei cidadã do país. Já faz 14 anos que eu sempre estou lá, indo e vindo, fazendo o meu trabalho. Nós achamos… que eu sou cambojana. Nós somos uma família cambojana. Assim como nós somos uma família namibiana, etíope, americana… Estes somos nós”, disse Jolie referindo-se às nacionalidades de seus filhos adotados e biológicos. “Eu não me sinto deslocada naquele país. Assim como eu não sinto que estive lá para roubar e contar sua história. Eu fui apenas um veículo para que eles pudessem contar a história deles”.

O drama recebeu sua estréia mundial em Fevereiro deste ano, ao livre, no complexo do templo Angkor Wat, no Camboja. Jolie e Ung não conseguiram dormir na noite anterior, mas elas não precisavam ter se preocupado – a exibição do filme que aconteceu naquela noite e nas noites que se seguiram nas semanas posteriores ao redor do Camboja “provocaram uma grande discussão no país entre as famílias que não falavam sobre o genocídio”.

A Netflix vai lançar “First They Killed My Father” ao redor do mundo no próximo dia 15 de Setembro. Jolie gosta da ideia de que o filme estará disponível através de uma plataforma de transmissão como essa, para que os espectadores possam assistir quando sentirem que estão prontos. “Com o primeiro filme que eu dirigi [“Na Terra de Amor e Ódio”, lançado em 2011], muitas pessoas bósnias contaram que não conseguiram assistir, que precisavam fazer pausas para depois voltar a ver; então, desta vez, eu estou mais ciente disso”.

Ela não tem realmente certeza do que vem em seguida. Família sim e, provavelmente, atuação. Ela assinou para interpretar o papel de Malévola em uma sequência do primeiro filme e riu quando o remake do filme “A Noiva de Frankenstein” foi mencionado. “Houve uma conversa, mas não acertamos nada. Quantos monstros uma pessoa só pode interpretar, realmente?”

Fonte: Screen Daily

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